Inserido no
canto IV surge o episódio “O Velho do Restelo”.
Vasco da Gama é
o narrador que canta ao rei de
Melinde – narratário – a
história de Portugal.
Esta narrativa
é feita em “in media res” e no
decorrer da conversa surge uma estreita
correlação entre o episódio “Despedidas em Belém” e o episódio “O Velho
do Restelo”.
Ponto d
situação: aglomerado de pessoas no porto, para se despedir dos entes queridos
que partiam para a Índia. No meio desse ambiente emocionado, destaca-se a
figura imponente de um velho que, com a sua "voz pesada", ouvida até
nas naus, faz um discurso condenando
aquela aventura cujo propósito, segundo ele, é a cobiça, o desejo de
riquezas, poder e fama.
O velho
interveio junto dos navegadores portugueses que se aprestavam para partir para
a empresa marítima da Índia, no sentido de os alertar contra os perigos da ambição em excesso e da cobiça pelas
riquezas vindas do Oriente. Diz o velho que, para enfrentar desnecessariamente
perigos desconhecidos, abandonavam os perigos urgentes do seu país, ainda
ameaçado pelos mouros.
Simbologia
Representa uma corrente desfavorável à expansão para o
Oriente, mais tolerante em relação à guerra no Norte de África. Traduz,
ainda, o medo do desconhecido e
a hesitação perante a novidade.
As falas das
mães e das esposas representam a reacção emocional àquela aventura, o discurso
do velho exprime uma posição racional,
fruto de bom senso da experiência (“tais
palavras tirou do experto peito”). É a expressão rigorosa do conservadorismo.
Como o Velho do
Restelo, pensavam muitos naqueles tempos, assim como muitos pensam hoje em
relação a assuntos semelhantes, como a conquista
espacial ou a manipulação
genética, por exemplo.
Quando
representa a voz do bom senso e da fria razão assume a dimensão de personagem alegórica – personagem que
defende um ideal/princípio.
O seu discurso denuncia a suposta irresponsabilidade dos
marinheiros que se deixavam levar por promessas fantasiosas, pela
vitória, para uma aventura com consequências trágicas
Poder-se-á
referir que todo o discurso desta figura se contrapõe á ambição explicitada ao longo da viagem realizada por Vasco da
Gama. É o negar do sonho, da ambição, da capacidade de iniciativa, logo
no seu discurso há:
.
A voz do
senso comum, dado que ele defendia a quietude simples, a rotina, a
anulação do desejo.
.
A negação do
mar, porque as suas palavras não reflectem o desbravar dos mares, o
conhecimento dos “húmidos caminhos”, mas sim, a ligação à terra, às lutas em
terra travadas com os Mouros no norte de África. Ignora a natureza aventureira
e bem sucedida dos portugueses.
.
Um mito
humanístico, pois valorizava as batalhas no norte de África,
nomeadamente as conquistas em Marrocos.
Logo o Velho
simboliza a perspectiva oposta à do espírito épico, apelidando de vaidade
aquilo que os outros chamavam de “Fama” e “Glória”, esforço e valentia.
Será que este
velho é o porta-voz do bom senso, da prudência, ou daqueles que no Sec. XVI
defendiam a expansão no norte de África ou a coordenação da ousadia humana, do
ultrapassar dos limites impostos.
.
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